quarta-feira, 17 de fevereiro de 2021

Gago Coutinho e a Associação Naval de Lisboa / Real Associação Naval

 Gago Coutinho Faria anos hoje a minha contribuição para a sua história na Associação Naval de Lisboa:







Carlos Viegas Gago Coutinho, nasceu em Belém, Lisboa, a 17 de Fevereiro de 1869. Filho primogénito de José Viegas Gago Coutinho, marítimo, natural de Faro e de Fortunata Maria Coutinho, natural de Faro, moradores na Calçada da Ajuda nº 5. Foi baptizado na Igreja de Santa Maria de Belém a 2 de Junho de 1869, morreu na Freguesia de Santa Engrácia às 18h05 do dia 18 de Fevereiro de 1959.

Era assim que descrevia a sua família:

«Meu pai era um homem de reduzida educação literária. Só a primária, mas conhecia escrita comercial, em que praticava. Sargento de mar-e-guerra até 1873, serviu na nau Vasco da Gama e na fragata D. Fernando. Era homem alto, desempenado, bem branco. (...) falecendo em Lisboa com 93 anos. Meus avós eram livreiros em Faro. (...) De minha mãe, senhora pequena, algarvia, filha de padeiros, e que devia ter ascendência moura, nada mais sei a não ser que um irmão dela era patrão de um cahique da costa (...). (...) Desde os 8 anos que foi minha mãe adoptiva uma amiga de minha mãe, D. Maria Augusta Pereira, falecida em 1914.»

Em 1885 Gago Coutinho concluiu o curso do Liceu e devido aos fracos recursos materiais de seu pai não conseguiu satisfazer a vontade de frequentar um curso de Engenharia na Alemanha, matriculou-se então na Escola Politécnica para preparar a sua entrada na Escola Naval, um ano depois. Entrou para a Armada como aspirante em 1886. Em 1890 foi promovido a guarda-marinha, em 1891 a segundo-tenente, e em 1895 possuía já a patente de primeiro-tenente. Em 1907 foi promovido ao posto de capitão-tenente e em 1915 a capitão-de-fragata. Em 1920 era já capitão-de-mar-e-guerra. Em 1922 foi promovido ao posto de vice-almirante, e em 1958 um ano antes de falecer, a almirante.

 

O seu primeiro grande embarque foi na corveta “Afonso de Albuquerque”, de 7 de Dezembro de 1888 a 16 de Janeiro de 1891, numa viagem para Moçambique pertencente à Divisão Naval da África Oriental. Seguidamente passou à canhoneira “Zaire”, na qual navegou até 24 de Abril de 1891, viajando de regresso a Lisboa. Colocado na Divisão Naval da África Ocidental, embarcou sucessivamente na lancha-canhoneira “Loge”, que comandou, na canhoneira “Limpopo”, na canhoneira “Zambeze”, e na corveta “Mindelo”. Durante o serviço nesta corveta no Brasil, em 1894, adoeceu com a febre-amarela, foi então internado no Hospital da Beneficência Portuguesa no Rio de Janeiro. Já em Portugal, esteve embarcado na canhoneira “Liberal” e na corveta “Duque da Terceira”. Foi nesta corveta que fez nova viagem ao Atlântico Norte. Viajou depois até Moçambique na embarcação de transporte “Pero de Alenquer” e, a seguir, ingressou na corveta “Rainha de Portugal”, embarcou então na canhoneira “Douro”, que o trouxe para Lisboa. Fez parte da guarnição da corveta couraçada “Vasco da Gama”, até 31 de Março de 1898, da qual passou para a sua primeira comissão como geógrafo ultramarino, em Timor.

De espírito inovador, era sincero e austero, afirmava: «Gosto de controvérsias, de tudo o que possa esclarecer, pois sou comunicativo como todos os homens do mar. Gosto da discussão que faz luz...». Normalmente modesto ao fazer as suas apresentações e conferências nas academias, qualidade que, segundo os que com ele conviviam, vinha cultivando desde sempre: «(durante a travessia), o meu papel foi secundário.» (Gago Coutinho, 30/03/1942). Também muito imaginativo, tinha sempre uma resposta de espírito pronta para dar, ou uma anedota para contar. Em resposta à pergunta: como tinha atravessado África a pé? Resposta pronta de Gago Coutinho: «Como havia de ser? Com as botas rotas, para a água sair mais à vontade, porque, para entrar, entrava sempre.»

Assinalável é também o seu gosto pelo desporto, visto não ser muito comum na época em que viveu. Desde adolescente que o praticava, remo, vela e especialmente ginástica com aparelhos. Já com alguma idade, ainda trabalhava com as argolas montadas numa trave do tecto na Rua da Madragoa, para se manter em forma. A prática desportiva interessava-o, e dedicou-lhe algumas das suas palavras, das quais temos o exemplo aquando da conferência do 71º. aniversário do Real Ginásio Clube Português (1946). Foi  Secretário Geral da Real Associação Naval/Associação Naval de Lisboa e rezam as crónicas que foi ele quem deu, em Portugal, o primeiro curso de Patrão da Náutica de Recreio, em 1900, na Real Associação Naval. Já no inicio do século XX organizava com frequência conferências no seu clube náutico.

Das suas diversas viagens destacamos:

1893 – No Mindelo (Luanda - Rio de Janeiro), cujo comandante era o grande almirante Augusto de Castilho

1896 - No Pero de Alenquer (Lisboa – Lourenço Marques), seguindo na medida do possível a histórica rota de Vasco da Gama, na sua viagem rumo à Índia, travessia que tão grandes ensinamentos lhe veio a fornecer para os seus estudos sobre "Náutica dos Descobrimentos".

Já com 75 anos fez, a bordo da barca portuguesa Foz do Douro, uma nova travessia à vela, Santos – Leixões, durante a qual navegou 105 dias, utilizando o histórico astrolábio, como os antigos mareantes portugueses, confirmando, assim, as suas opiniões sobre as rotas por estes seguidas.

Calcula-se, por conseguinte, que durante toda a sua vida, o almirante teria navegado 30837 milhas o que, por certo, constitui um recorde para todos os oficiais do seu tempo. A sua missão, a bordo dos barcos em que prestou serviço, foi, quase exclusivamente, de "oficial encarregado da navegação", daqui vindo a resultar o conhecimento que manteve com o sextante clássico.

De 1913 a 1914 Gago Coutinho comandou a  missão de delimitação da fronteira Angola com a Rodésia, surgindo como seu colaborador o segundo-tenente Arthur de Sacadura Cabral a quem o almirante apelidava de «observador de fina vista».

A competência do geógrafo levou à sua nomeação pelo Ministério da Guerra, em 1928, a presidente da Comissão, para propor a reorganização dos serviços geográficos, cadastrais e cartográficos. Neste mesmo ano passou igualmente a vogal da comissão encarregada de estudar o estabelecimento de um aeroporto nos Açores, e a navegação aérea nas colónias

Desempenhou ainda as funções de Presidente da Comissão de Cartografia, contribuíndo eficazmente para a criação da missão geográfica de Moçambique e para a solução definitiva da fronteira luso-belga na região do Dilolo.

Assim, o seu interesse pela aviação não surgiu apenas do espírito Romântico que esta inspirava, mas principalmente do caracter científico do almirante. Gago Coutinho pressentiu na aviação uma hipótese de novas descobertas científicas, onde desejava aplicar os seus inúmeros conhecimentos e pesquisar quer a nível marítimo quer a nível terrestre. O emprego, quase diário, que havia feito, em África, durante as suas missões de geógrafo, do sextante e o grande conhecimento sobre este instrumento, eram mais que suficientes para justificar a sua opinião. Assim, Gago Coutinho foi um dos primeiros oficiais de Marinha a oferecer-se para ir ao estrangeiro obter a sua «Carta de piloto do ar», uma vez que a de «piloto do mar» já tinha há alguns anos. Tirou o Brevet em França em 1915, num frágil Maurice Farman, o "baptismo do ar" do almirante realizou-se em Portugal, mais propriamente na Escola de Aviação Militar em Vila Nova da Rainha, acompanhado pelo já piloto-aviador Sacadura. Nesta escola, foi, mais tarde, instrutor.

A propósito da sua passagem pela escola referida, e já no contexto das experiências aéreas na companhia, de Sacadura Cabral, o almirante comenta:

«Vou ao aeródromo de Vila Nova da Rainha e dou três voos com o Sacadura. Total, 35 minutos no ar. Admirável a segurança; demos vários saltos, curvas, etc. até governei um pouco. Pareceu-me bastante fácil e muito mais seguro do que eu julgava. Em todo o caso, entusiasmei-me.»

Esta foi a primeira de algumas das suas experiências de voo que culminariam com a Travessia Aérea do Atlântico Sul, que consagra o nome de Gago Coutinho como aviador, na História Nacional.

 

 

OBRAS PUBLICADAS:

Algumas determinações de longitude feitas ultimamente em África pela missão da fronteiro do Barotze, 1915

As determinações de latitude pela missão da fronteira Barotze, 1915

Impressões de duas viagens através de África entre Angola e Moçambique, 1915

Relatório da missão geodésica de São Tomé. 1920

Relatório da viagem aérea Lisboa-Rio de Janeiro, 1923 (de colaboração de Sacadura Cabral)

Tentativa de interpretação simples da teoria da relatividade restrita, 1926

O roteiro da viagem de Vasco da Gama e a sua versão nos Lusíadas, 1930

Desdobramento da derrota de Vasco da Gama nos Lusíadas, 1931

Possibilidade da rota única de Vasco da Gama em Os Lusíadas. Impossibilidade de Vasco da Gama ter de Cabo Verde navegado para o Sul, 1931

Pela Segunda vez, possibilidade de ler em Os Lusíadas uma rota única de Vasco da Gama, 1933

Gaspar Côrte-Real, 1933

Alguns erros em que se apoiou o desdobramento da rota de Vasco da Gama em Os Lusíadas, 1933

Continuação dos erros em que se apoiou o desdobramento da rota de Vasco da Gama em Os Lusíadas, 1934

Passagem do Cabo Bojador, 1935

Influência que as primitivas viagens portuguesas à América do Norte tiveram sobre o descobrimento das Terras de Santa Cruz, 1937

O almirante foi também colaborador da Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira

 

Bibliografia

ALBUQUERQUE, Luís de, Curso de História da Náutica, Lisboa, Alfa, 1989.

BOLÉO, José de Oliveira, Gago Coutinho e Sacadura Cabral, Lisboa, Sociedade de Geografia, 1972.

CORRÊA, Pinheiro, Gago Coutinho, Precursor da Navegação Aérea, Porto, Portucalense Editora, 1969.

Correia, José Pedro Pinheiro,

LEMOS; Carlos M. Oliveira e, O Almirante Gago Coutinho, Lisboa, Instituto Hidrográfico, 2000.

REIS, Manuel dos, CORTESÃO, Armando, Gago Coutinho Geógrafo, Coimbra, Junta de Investigações do Ultramar, 1970, sep. de Memórias da Academia das Ciências de Lisboa, Tomo XIII, 1969. 

http://cvc.instituto-camoes.pt/ciencia/index1.html





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