terça-feira, 29 de janeiro de 2019

Remo no Mundo


O Remo como meio de propulsão, que consiste em colocar a pá dentro de água com um ponto de apoio na borda da embarcação é utilizado desde sempre. Sendo mais fácil em mares abrigados, não invalida, no entanto, o seu uso na travessia dos Oceanos como nos foi demonstrado pelos “Drakkars” Vikings.



Tendo começado, certamente pela utilização de um tronco flutuante o Homem foi desenvolvendo embarcações cada vez mais sofisticadas através da união de troncos chegando até aos impressionantes Trirremes,

  
Trirreme

                                          


que utilizavam cerca de 170 remadores. Foram usados no Mediterrâneo, onde os homens chegavam a morrer à fome, à sede ou em pleno combate nessas embarcações.



                      
                                                               


O Remo como desporto de competição é um dos mais antigos e tradicionais, regatas entre galeras faziam parte das civilizações egípcias, gregas e romanas. Na Odisseia, Homero fala-nos numa viagem de Ulisses, pela ilha de Ítaca, num barco a remos, enquanto que na Eneida, Virgílio conta-nos que Eneias, príncipe de Tróia, homenageou seu pai, com uma disputa entre quatro barcos, movidos por duzentos remadores acorrentados às embarcações. O Faraó Amenophis II foi imortalizado na sua tomba remando, há também excertos de uma regata em Veneza no ano de 1315.
Apesar do Remo ser muito popular entre profissionais só no início dos anos 1700 é que o desporto se popularizou entre cidadãos amadores quando principiaram as regatas ao longo do Tamisa, das quais a mais antiga que se conhece é a Doggett´s Coat and Badge Race que toma lugar desde 1715.

                                             
                                                                                                        
 Largada da 1ª Doggett´s  Badge Race                                                                      Doggett´s badge

 Em 17 Julho de 1717 realizou-se um Festival de Água da qual fazia parte uma regata de remo em Chelsea, no Tamisa, que obtinha muitos patrocinadores e que constituiu a possibilidade para Handel compor a sua “Water Music” a pedido do Rei George I. Nos finais do século XVIII o Remo começou a fazer parte do desporto Universitário o que lhe proporcionou um grande incremento, principalmente depois de em 1829 ter sido estabelecida a primeira das tradicionais regatas entre Oxford e Cambridge. Dez anos volvidos e efectuava-se a primeira das célebres regatas de Henley.
Nos Estados Unidos a regata de Yale contra Harvard teve o seu início em 1852. O Canadiano Ned Hanlan (conhecido como “The Boy In Blue”, dado que envergava uma camisola azul) a nível profissional sagrou-se Campeão do Mundo entre 1880 e 1884 em Skiff, ainda antes das Olimpíadas.
Ned Hanlan


O pai dos Jogos olímpicos, Barão Pierre de Coubertain, escreveu várias vezes sobre o desporto do Remo, uma das quais com esta bela frase que nos transmite a ideia geral do Remo “O intenso esforço do remador, a harmonia e o sincronismo dos seus movimentos na transposição das barreiras naturais fazem do Remo um desporto ideal”.


Pierre de Coubertin, fundador dos Jogos Olímpicos modernos, em Ouchy ©

A Federation Internationale dês Societès d´Aviron (FISA), fundada em 1892, é a mais antiga de todas as Federações desportivas, possui a sua sede em Lausanne e conta com mais de uma centena de membros. A Federação Portuguesa do Remo, uma das mais antigas de Portugal, fundada em 1920 é membro da FISA desde 1922.

                                                                           
                FPR                                                                                      
                                                                                            FISA
Apesar da técnica de Remo não ter sofrido grandes alterações ao longo do tempo, o desenho, a construção e o peso do equipamento utilizado no desporto do Remo sofreu grandes modificações em especial no século vinte.
As primeiras embarcações de corrida eram de casco trincado robustas e pesadas, o atleta utilizava apenas os braços e o tronco como meio de propulsão. Existiam com um, dois, quatro seis e oito remadores, actualmente desapareceram as de seis. Os barcos eram conhecidos como inriggers ou outriggers conforme a sua forqueta ou tolete era colocada directamente no casco, ou utilizavam uns acrescentos em metal, as aranhas (que apareceram por volta de 1828). Em outriggers remava-se no Skiff ou Single de um atleta com remos parelhos, no Pair-Oar de dois atletas, cada um com um remo de ponta e timoneiro, no Double Skull de dois atletas com remos parelhos, sem timoneiro e nos de quatro, seis e oito remadores com timoneiro e remos de ponta.
A beleza do Remo encontra-se no ritmo dos atletas que impulsionam a embarcação (“A Sinfonia do Movimento”como descrevia o construtor George Pocock). O estilo e o ritmo têm variado ao longo dos anos, sendo que actualmente, a remada consiste num movimento cadenciado e distinto durante o seu ciclo. A remada pode ser dividida em várias partes, iniciando-se no ataque, com a tomada de água, a passagem do remo na água e o final com o safar do remo (saída da pá da água), depois vem o deslize do remador com o remo fora de água e o início de um novo ciclo da remada. O remador está sentado de costas para a proa da embarcação, o movimento é gerado por uma sequência de Pernas, Tronco e Braços e o deslize fora de água é o inverso com Braços, Tronco e por fim as Pernas. 
Basicamente podemos dividir a modalidade em Remo de Ponta e de Parelhos. No Remo de Ponta o atleta segura um remo, com cerca de 3,90 metros, utilizando para isso as duas mãos, na disciplina de Parelhos, o remador segura um remo em cada mão, de cerca de 3m de comprimento. Os remos começaram por ser em madeira mas actualmente são construídos em material compósito, ultralight.


Actualmente no Remo Olímpico, só existem barcos de tipo Shell (sucessores dos outriggers) podendo ser divididos no Skiff (1X) – Um atleta com dois remos parelhos, o Double Skull (2X) – com dois atletas de remos parelhos, o Quadri Skull (4X) – quatro atletas com remos parelhos, o Shell de dois sem timoneiro (2-) – dois atletas com remos de ponta, o Quatro sem timoneiro (4-) – quatro atletas cada um com o seu remo de ponta, e o barco rei do Remo o Shell de oito (8+) – oito atletas com timoneiro e cada atleta com um remo de ponta; competimos ainda em Shell de dois com timoneiro (2+) – dois atletas com um remo de ponta cada e com um timoneiro, no Quatro com timoneiro (4+) – quatro atletas com um remo de ponta cada e com um timoneiro, embora estas últimas duas embarcações não pertençam ao alinhamento dos Jogos Olímpicos, por razões economicistas. O comprimento das embarcações varia entre cerca de sete metros no Skiff e dezoito metros no Oito, que é dividido em duas partes, para melhor ser transportado. Durante as regatas de Remo o plano de água permite o alinhamento de pelo menos seis tripulações, em pistas com um mínimo de 12,50 m até um máximo de 15m de largura e um comprimento de 2 Km em linha recta. As pistas são delimitadas por bóias que estão colocadas com um intervalo de 12,2 m. Nos rios de maior caudal é usual, em Portugal, especialmente em Lisboa, remar com uma embarcação de casco trincado com sete tábuas de cada lado – o Yolle – que é utilizado em barcos de quatro e oito atletas com timoneiro e remos de ponta. O Yolle (sucessor das Guigas) é uma embarcação na qual os atletas se colocam em zigzag e não em fila como no Shell ficando a forqueta colocada nas falcas portanto, sem aranhas (inrigger).
Para direccionar as embarcações o timoneiro utiliza o leme, uma peça móvel em torno de um eixo colocado na ré e dirigido por uns cabos, chamados gualdropes (ou galdropes). Nas embarcações quando não existe timoneiro o leme é comandado por um dos remadores através do seu sapato (pé).
               
Em 1857 J.C. Babcock de New York inventou uma forma de slide num Skiff e em 1870 adaptou-o num barco de seis remos. O slide ou carrinho veio dar um grande incremento no andamento da embarcação pois possibilitou a utilização das pernas na remada. Em 1875 Michael Davis patenteou a forqueta com travinca e no ano seguinte desenvolveu uma embarcação com aranhas móveis. As aranhas móveis foram mais tarde proibidas pela FISA e por este facto não é usado, apesar de possibilitar um andamento muito superior à das embarcações com aranhas normais.

M.F. Davis patent#165,072                                  


                                            
                                                                   M.F. Davis patent#209,960


Em 1893 a FISA organizou o seu primeiro Campeonato da Europa de Remo, em Orta, Itália, nesse mesmo ano fundou-se em Cambridge`s Newnham College a primeira Sociedade de Remo Feminino.
Em 1896 foram eliminadas das Regatas de Boston City as provas com profissionais. Ainda nesse ano, na Grécia, realizaram-se as I Olimpíadas modernas das quais o Remo fazia parte, no entanto as provas foram canceladas devido ao mau tempo. Desde essa data que o Remo faz parte dos Jogos Olímpicos sendo o único desporto com essa continuidade e longevidade.



CARTAZ DOS J.O. 1896



Em 1916 o Remo para ligeiros, atletas com menos de 72,5 Kg, foi introduzido nas universidades americanas por Joe Wright na Pensilvânia, ao mesmo tempo que, em Inglaterra, Steve Fairbairn começava a treinar no estilo que ficou com o seu nome e obtinha excelentes resultados.
Em 1923 formava-se em Inglaterra a Women`s Amateur Rowing Association e em 1927 a tradicional Boat Race (Oxford - Cambridge), foi pela primeira vez televisionada pela BBC enquanto se iniciava também a regata Oxford – Cambridge em Femininos.

100th race   A 100ª REGATA OXFORD – CAMBRIDGE

Nos anos seguintes o Remo continuou a ser um dos desportos mais praticados ao mesmo tempo que se assistia a um grande incremento técnico e de material, as embarcações tornaram-se mais leves e sofisticadas e as tripulações evidenciaram uma técnica mais apurada devido ao aumento do treino e do seu controle. Durante o período da II guerra mundial as competições foram praticamente todas suspensas. Com a divisão europeia nos dois blocos também o Remo sofreu grandes diferenças na sua técnica e estilo havendo duas grandes escolas, – a Alemã Ocidental e a dos países de Leste com a sua política de desporto nacional.
Em 1954 realizaram-se os primeiros Campeonatos da Europa de Femininos que foram dominados pela União Soviética. No ano de 1962 competiram-se em Lucerna os primeiros Campeonatos do Mundo realizados pela FISA, assim como em 1967 a primeira regata FISA Júnior foi organizada em Ratzburg na Alemanha.
Durante o ano de 1969 foi construída a primeira embarcação desenhada para Remo de Recreio (o Alden Ocean Shell, lançado por Arthur Martin) o que veio introduzir uma nova vertente no Desporto mais antigo do Mundo.
Nos mundiais de 1970 os alemães orientais conseguiram medalhas de ouro ou prata em todas as provas.
Em 1974 pela primeira vez realizaram-se em Lucerna os Campeonatos do Mundo para Pesos Ligeiros e para Femininos em que a distância para elas era de 1000 metros. Ainda nesta distância realizaram-se em Montreal, em 1976 as primeiras Regatas Olímpicas de Femininos. Na vertente de Pesos Ligeiros as classes Femininas e Masculinas só fizeram parte do emblema olímpico em 1996, nos Jogos de Atlanta.

Foi em 1977 que os irmãos Dreissigacker começaram a construir remos de material compósito e em 1981 lançaram também no mercado o ergómetro Concept II que veio revolucionar o treino do remo e universalizar um dos desportos mais completos que se pratica.
O primeiro Campeonato do Mundo de Femininos Pesos Ligeiros teve lugar no ano de 1985 em Hazewinkel em que a distância de prova para as mulheres foi igualada à dos homens.
Em 1991 mais uma vez os Dreissigacker desenharam e lançaram no mercado uma inovação – os remos com pá de cutelo – que com o aumento do tamanho da pá iria ajudar os atletas com pior técnica mas que em equipas de topo nunca se chegou à conclusão da sua real vantagem, apesar da seguinte universalização das pás Big Blade (um melhoramento da pá de cutelo que fica sem a espinha). Ao longo das épocas estes remos continuam sofrendo várias alterações mínimas que apenas servem a economia e o consumismo da empresa americana.
Nesse mesmo ano como não podia deixar de ser, foi inaugurado em Inglaterra, pela Rainha Isabel II o Museu do Remo com o nome de River and Rowing Museum.

No limiar do século XXI o britânico Steve Redgrave conquistou a sua quinta medalha de Ouro olímpica em cinco olimpíadas consecutivas algo nunca conseguido por outro atleta em desportos de endurance. Outro atleta, também remador e inglês, Jack Beresford conseguiu três medalhas de ouro e duas de prata em cinco olimpíadas, tendo sido apenas traído pelo cancelamento dos Jogos Olímpicos que se deviam realizar em 1940.