O Remo no Mundo - a minha visão
O Remo como meio de propulsão,
que consiste em colocar a pá dentro de água com um ponto de apoio na borda da
embarcação é utilizado desde sempre. Sendo mais fácil em mares abrigados, não
invalida, no entanto, o seu uso na travessia dos Oceanos como nos foi
demonstrado pelos “Drakkars”
Vikings.
Tendo começado, certamente pela
utilização de um tronco flutuante o Homem foi desenvolvendo embarcações cada
vez mais sofisticadas através da união de troncos chegando até aos
impressionantes Trirremes,
que utilizavam cerca de 170
remadores. Foram Usados no Mediterrâneo, onde os homens chegavam a morrer à
fome, à sede ou em pleno combate nessas embarcações.
O Remo como desporto de
competição é um dos mais antigos e tradicionais, regatas entre galeras faziam
parte das civilizações egípcias, gregas e romanas. Na Odisseia, Homero fala-nos
numa viagem de Ulisses, pela ilha de Ítaca, num barco a remos, enquanto que na
Eneida, Virgílio conta-nos que Eneias, príncipe de Tróia, homenageou seu pai,
com uma disputa entre quatro barcos, movidos por duzentos remadores
acorrentados às embarcações. O Faraó Amenophis II foi imortalizado na sua tomba
remando, há também excertos de uma regata em Veneza no ano de 1315.
Apesar
do Remo ser muito popular entre profissionais só no inicio dos anos 1700 é que
o desporto se popularizou entre cidadãos
amadores quando principiaram as regatas ao longo do Tamisa, das quais a
mais antiga que se conhece é a Doggett´s
Coat and Badge Race que toma lugar desde 1715.
Em 1775 realizou-se um Festival de Água da
qual fazia parte uma regata de remo em Chelsea, no Tamisa, que obtinha muitos
patrocinadores e que constituiu a possibilidade para Handel compor a sua “Water
Music”. Nos finais do século XVIII o Remo começou a fazer parte do desporto
Universitário o que lhe proporcionou um grande incremento, principalmente
depois de em 1829 ter sido estabelecida a primeira das tradicionais regatas
entre Oxford e Cambridge. Dez anos volvidos e efectuava-se a primeira das
célebres regatas de Henley.
Nos Estados Unidos a regata de
Yale contra Harvard teve o seu início em 1852. O Canadiano Ned Hanlan (“The Boy In Blue”, dado que envergava uma camisola
azul) a nível profissional sagrou-se Campeão do Mundo entre 1880 e 1884 em Skiff,
ainda antes das Olimpíadas.
Pierre de Coubertin, fundador dos Jogos Olímpicos modernos, em
Ouchy ©
O pai
dos Jogos olímpicos, Barão Pierre de Coubertain, escreveu várias vezes sobre o
desporto do Remo, uma das quais com esta bela frase que nos transmite a ideia
geral do Remo “O intenso esforço do remador, a harmonia e o sincronismo dos seus
movimentos na transposição das barreiras naturais fazem do Remo um desporto
ideal”.
A
Federation Internationale dês Societès d´Aviron (FISA), fundada em 1892, é a
mais antiga de todas as Federações desportivas, possui a sua sede em Lausanne
com mais de uma centena de membros. A Federação Portuguesa do Remo, a mais
antiga de Portugal, fundada em 1920 é membro da FISA desde 1922.
FPR
FISA
Apesar da técnica de remo não ter
sofrido grandes alterações ao longo do tempo, o desenho, a construção e o peso
do equipamento utilizado no desporto do Remo sofreu grandes modificações em
especial no século vinte.
As primeiras embarcações de
corrida eram de casco trincado robustas e pesadas, o atleta utilizava apenas os
braços e o tronco como meio de propulsão. Existiam com um, dois, quatro seis e
oito remadores, actualmente desapareceram as de seis. Os barcos eram conhecidos
como inriggers ou outriggers conforme a sua forqueta ou tolete era colocada
directamente no casco, ou utilizavam uns acrescentos em metal, as aranhas (que
apareceram por volta de 1828). Em outriggers existiam o Skiff ou Single de um
atleta com remos parelhos, o Pair-Oar de dois atletas, cada um com um remo de
ponta e timoneiro, o Double Skull de dois atletas com remos parelhos, sem
timoneiro e os de quatro, seis e oito remadores com timoneiro e remos de ponta.
A beleza do Remo encontra-se no
ritmo dos atletas que impulsionam a embarcação (“A Sinfonia do Movimento”como
descrevia o construtor George Pocock). O estilo e o ritmo têm variado ao longo
dos anos, sendo que actualmente, a remada consiste num movimento cadenciado e
distinto durante o seu ciclo. A remada pode ser dividida em várias partes,
iniciando-se no ataque, com a tomada de água, a passagem do remo na água e o
final com o safar do remo (saída da pá da água), depois vem o deslize do
remador com o remo fora de água e o início de um novo ciclo da remada. O
remador está sentado de costas para a proa da embarcação, o movimento é gerado
por uma sequência de Pernas, Tronco e Braços e o deslize fora de água é o
inverso com Braços, Tronco e por fim as Pernas.
Basicamente podemos dividir a
modalidade em Remo de Ponta e de Parelhos. No Remo de Ponta o atleta segura um
remo, com cerca de 3,90
metros, utilizando para isso as duas mãos, na disciplina
de Parelhos, o remador segura um remo em cada mão, de cerca de 3m de
comprimento. Os remos começaram por ser em madeira mas actualmente são
construídos em material compósito, ultralight.
Actualmente no Remo Olímpico, só
existem barcos de tipo Shell (sucessores dos outriggers) podendo ser divididos no
Skiff (1X) – Um atleta com dois remos parelhos, o Double Skull (2X) – com dois
atletas de remos parelhos, o Quadri Skull (4X) – quatro atletas com remos
parelhos, o Shell de dois sem timoneiro (2-) – dois atletas com remos de ponta,
o Quatro sem timoneiro (4-) – quatro atletas cada um com o seu remo de ponta, e
o barco rei do Remo o Shell de oito (8+) – oito atletas com timoneiro e cada
atleta com um remo de ponta; competimos ainda em Shell de dois com timoneiro
(2+) – dois atletas com um remo de ponta cada e com um timoneiro, no Quatro com
timoneiro (4+) – quatro atletas com um remo de ponta cada e com um timoneiro,
embora estas últimas duas embarcações não pertençam ao alinhamento dos Jogos
Olímpicos, por razões economicistas. O comprimento das embarcações varia entre
cerca de sete metros no Skiff e dezoito metros no Oito, que é dividido em duas
partes, para melhor ser transportado. Durante as regatas de Remo o plano de
água permite o alinhamento de pelo menos seis tripulações, em pistas com um
mínimo de 12,50 m
até um máximo de 15m de largura e um comprimento de 2 Km em linha recta. As pistas
são delimitadas por bóias que estão colocadas com um intervalo de 12,2 m. Nos rios de maior
caudal é usual, em Portugal, especialmente em Lisboa, remar com uma embarcação
de casco trincado com sete tábuas de cada lado – o Yolle – que é utilizado em
barcos de quatro e oito atletas com timoneiro e remos de ponta. O Yolle (sucessor
das Guigas) é uma embarcação na qual os atletas se colocam em zigzag e não em
fila como no Shell ficando a forqueta colocada nas falcas portanto, sem aranhas
(inrigger). Para direccionar as embarcações o timoneiro utiliza o leme, uma
peça móvel em torno de um eixo colocado na ré e dirigido por uns cabos,
chamados gualdropes (ou galdropes). Quando não existe timoneiro o leme é
comandado por um dos remadores através do seu sapato (pé).
Em 1857 J.C. Babcock de New York
inventou uma forma de slide num Skiff
e em 1870 adaptou-o num barco de seis remos. O slide ou carrinho veio dar um
grande incremento no andamento da embarcação pois possibilitou a utilização das
pernas na remada. Em 1875 Michael Davis patenteou a forqueta com travinca e no ano seguinte desenvolveu
uma embarcação com aranhas móveis. As aranhas móveis foram mais tarde proibidas
pela FISA, por este facto não é usado, apesar de possibilitar um andamento
muito superior à das embarcações com aranhas normais.
M.F. Davis patent#165,072
M.F. Davis patent#209,960
Em 1893 a FISA organizou o seu
primeiro Campeonato da Europa de Remo, em Orta, Itália, nesse mesmo ano
fundou-se em Cambridge`s Newnham College
a primeira Sociedade de Remo Feminino.
Em
1896 foram eliminadas das Regatas de Boston
City as provas com profissionais. Ainda nesse ano, na Grécia, realizaram-se
as I Olimpíadas modernas das quais o Remo fazia parte, no entanto as provas
foram canceladas devido ao mau tempo. Desde essa data que o Remo faz parte dos
Jogos Olímpicos.
CARTAZ DOS J.O. 1896
Em 1916 o Remo para ligeiros,
atletas com menos de 72,5 Kg,
foi introduzido nas universidades americanas por Joe Wright na Pensilvânia, ao mesmo tempo que, em Inglaterra, Steve
Fairbairn começava a treinar no estilo que ficou com o seu nome e
obtinha excelentes resultados.
Em 1923 formava-se em Inglaterra
a Women`s Amateur Rowing Association
e em 1927 a
tradicional Boat Race (Oxford -
Cambridge), foi pela primeira vez televisionada pela BBC enquanto
que se iniciava também a regata Oxford – Cambridge
no Feminino.
A
100ª REGATA OXFORD – CAMBRIDGE
Nos anos seguintes o Remo
continuou a ser um dos desportos mais praticados ao mesmo tempo que se assistia
a um grande incremento técnico e de material, as embarcações tornaram-se mais
leves e sofisticadas e as tripulações evidenciaram uma técnica mais apurada
devido ao aumento do treino e do seu controle. Durante o período da II guerra
mundial as competições foram praticamente todas suspensas. Com a divisão
europeia nos dois blocos também o Remo sofreu grandes diferenças na sua técnica
e estilo havendo duas grandes escolas, – a Alemã Ocidental e a dos países de
Leste com a sua política de desporto nacional.
Em 1954 realizaram-se os primeiros
campeonatos da Europa Femininos que foram dominados pela União Soviética. No
ano de 1962 competiram-se em Lucerna os primeiros Campeonatos do Mundo
realizados pela FISA, assim como em 1967 a primeira regata FISA Júnior foi
organizada em Ratzburg, Alemanha. Durante o ano de
1969 foi construído a primeira embarcação desenhada para Remo de Recreio (o
Alden Ocean Shell, lançado por Arthur Martin) o que veio introduzir uma nova
vertente no Desporto mais antigo do Mundo. Nos mundiais de 1970 os
alemães orientais conseguiram medalhas de ouro ou prata em todas as provas. Em 1974 pela primeira vez realizaram-se em Lucerna os
Campeonatos do Mundo para Pesos Ligeiros e para Femininos em que a distância
para elas era de 1000
metros. Ainda nesta distância realizaram-se em Montreal,
em 1976 as primeiras Regatas Olímpicas de Femininos. Na vertente de Pesos
Ligeiros as classes Femininas e Masculinas só fizeram parte do emblema olímpico
em 1996, Atlanta.
Foi em 1977 que os irmãos
Dreissigacker começaram a construir remos de material compósito e em 1981
lançaram também no mercado o ergómetro Concept
II que veio revolucionar o treino do remo e universalizar um dos desportos
mais completos que se pratica.
O primeiro Campeonato do Mundo de
Femininos Pesos Ligeiros teve lugar no ano de 1985 em Hazewinkel em que a
distância de prova para as mulheres foi igualada à dos homens. Em 1991 mais uma
vez os Dreissigacker desenharam e lançaram no mercado uma inovação – os remos
com pá de cutelo – que com o aumento do tamanho da pá iria ajudar os atletas
com pior técnica mas que em equipas de topo nunca se chegou à conclusão da sua
vantagem, apesar da seguinte universalização das pás Big Blade (um melhoramento
da pá de cutelo que fica sem a espinha). Ao longo das épocas estes remos
continuam sofrendo várias alterações mínimas que apenas servem a economia e o
consumismo da empresa americana.
Nesse mesmo ano como não podia
deixar de ser, foi inaugurado em Inglaterra, pela Rainha Isabel II o Museu do Remo
com o nome de River and Rowing Museum.
No limiar do século XXI o
britânico Steve Redgrave conquistou a sua quinta medalha de ouro olímpica em
cinco olimpíadas consecutivas algo nunca conseguido por outro atleta em
desportos de endurance. Outro atleta, também remador e inglês, Jack Beresford
conseguiu três medalhas de ouro e duas de prata em cinco olimpíadas, tendo sido
apenas traído pelo cancelamento dos jogos olímpicos que se deviam realizar em
1940. Nos femininos Elisabeta Lipă venceu cinco medalhas de ouro, duas de prata
e uma de bronze nas suas presenças em seis jogos, Georgeta Damian venceu também
cinco medalhas de ouro e uma de bronze nas três olimpíadas em que competiu,
Ekaterina Karsten venceu três medalhas nas suas três presenças em olimpíadas
duas de ouro e uma de bronze.
Steve Redgrave – GB